Como as pessoas inicialmente se reúnem para criar um projeto on-line? Por que elas escolhem as licenças livres? Como o grupo se organiza quando está crescendo? Qual é o modelo econômico dessas organizações? Essas são as principais questões do artigo “Fundações de código aberto como inovadoras sociais em economias emergentes: o estudo de caso no Brasil”, do Clément Bert-Erboul, especialista em sociologia econômica, e do professor Nicholas Vonortas. A pesquisa, focada na dinâmica das organizações, tem a Open Knowledge Brasil (OKBR) como objeto de estudo. A intenção deles é apresentar o trabalho sobre inovação social na conferência Globelics, em outubro, e depois submeter para uma revista internacional.
Segundo Clément, o Brasil tem uma história especial de propriedade intelectual. Por isso ele tem interesse particular neste país. “Eu fiz o meu doutorado sobre as redes sociais de comunidades livres na França (Sésamath, Videolan e OWNI) para entender como as licenças gratuitas são usadas em diferentes profissões. Agora, minha pesquisa no Brasil me permite fazer um estudo sobre outros tipos de comunidades e fazer uma análise mais geral para tentar uma comparação internacional”, diz.
Entre 2010 e 2014, no Departamento de Sociologia da Universidade de Lille 1, Clément fez doutorado sobre o impacto das instituições sobre as redes sociais da Internet. Desde 2016, Clément é pós-doutorando no Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) da UNICAMP. “Tenho uma bolsa de estudos pós-doc da FAPESP para trabalhar em redes de conhecimento e propriedade intelectual até outubro de 2018. No DPCT, eu trabalho com a equipe INSYSPO focada em políticas científicas de inovação. Tenho interesse em estudar comunidades como a OKBR ou análise de scientometrics da plataforma Lattes, por exemplo. Também trabalho no DPCT com Luis Ignacio Reyes Galindo no acesso aberto de revistas científicas e Gil Vicente sobre o bio hacking”, disse.
Confira, abaixo, a conversa que tivemos com Clément sobre seu estudo:
OKBR: Por qual motivo veio para o Brasil?
Clément: O Brasil tem uma história especial de propriedade intelectual. Por isso, eu tenho interesse particular neste país. Eu fiz o meu doutorado sobre as redes sociais de comunidades livres na França (Sésamath, Videolan e OWNI) para entender como em diferentes profissões, as licenças gratuitas são usadas. Agora, minha pesquisa no Brasil me permite fazer campo sobre outros tipos de comunidades e fazer uma análise mais geral para tentar uma comparação internacional.
OKBR: Por que escolheu a OKBR como objeto de pesquisa?
Clément: Minha pesquisa na França era sobre profissões diferentes, como professores, jornalistas e engenheiros de informação. Quero ver como diferentes tipos de organizações que não são de informática usam a licença aberta. A OKBR é um bom exemplo dessa difusão em diferentes atividades que se chama processo de institucionalização. É possível analisar diferentes tipos de contribuições como os acadêmicos, os ativistas das ONGs, os membros do OKBR, empresas ou contribuidores individuais.
OKBR: Desde quando você se interessa pelos temas que a Open Knowledge aborda?
Clément: Estou trabalhando em dados livres desde o final da minha pós-graduação. Grande parte do meu trabalho foi na comunidade Sésamath. Na França, esse grupo produziu manuais escolares e software para matemática em colégios secundários. O modelo econômico dessa organização tem a particularidade de vender manuais em papel e distribuir gratuitamente o mesmo conteúdo online.
OKBR: Quais são os desafios da sua pesquisa?
Clément: O desafio mais importante da minha pesquisa é buscar dados qualitativos e quantitativos. Eu desejo comparar minhas análises de rede com entrevistas de contribuidores. Hoje as tecnologias mudam. As tecnologias de comunicação das comunidades viram proprietárias com o Facebook, o WhatsApp etc. Este fenômeno está excluindo os pesquisadores públicos no exterior dos campos numéricos. Em seguida, eu trabalhei com arquivos de listas com endereços de e-mails públicos, mas agora essas tecnologias não estão sendo mais usadas. Acho que esse fenômeno vai ser um problema para marcar e registrar a história das comunidades online que a base de minha pesquisa possibilitou.
OKBR: Quais são os destaques?
Clément: Os arquivos das listas de discussões da OKBR têm muita informação para tornar a rede social dos colaboradores e analisar as diferentes organizações que participam das discussões. É possível estudar muito bem o processo de institucionalização de comunidades.
OKBR: Pelas suas pesquisas, o que sugere para aprimorar o trabalho e aumentar o impacto da Open Knowledge Brasil?
Clément: O resultado principal do artigo é que a institucionalização comunitária tende a reduzir a diversidade das origens institucionais dos contribuintes. Isso poderia ser um problema para o turn-over de sua comunidade.
Para resumir nossos resultados, podemos dizer que existem dois tipos de inovadores sociais em código aberto: insiders e outsiders. Em primeiro lugar, os insiders estão envolvidos em um processo de baixo para cima e usando uma instituição dedicada para realizar suas ideias em colaboração com uma organização estruturada em uma área geográfica restrita. Em segundo lugar, os outsiders participam de longe com diferentes organizações e trabalham em instituições na periferia dos campos de código aberto, como as universidades. Eles têm a possibilidade de engajar processos de inovação de alto e baixo nível, sem uma forte participação de comunidades locais abertas. Essas categorias podem ser identificadas em uma rede social, e sua gestão específica deve melhorar a inovação, visando atores-chave, geralmente ignorados devido ao seu baixo envolvimento a priori em um layout núcleo / periferia.
Esses resultados podem significar, pelo menos, duas coisas que não são contraditórias. Primeiro, os acadêmicos e as empresas representam inovadores sociais independentes – específicos em comparação com as organizações sem fins lucrativos envolvidas em cidades específicas. Em segundo lugar, as comunidades acadêmicas e de empresas estão muito dispersas tanto no nível nacional quanto no nível internacional. Para uma investigação futura, a avaliação desses grupos não pode ser feita em apenas uma monografia, mas múltiplas investigações de campo.
*Explicação sobre a imagem da matéria:
A imagem foi feita com dados do arquivo da mailing list da Open Knowledge Brasil durante o ano de 2014. As cores representam as pessoas que se envolvem no mesmos tópicos (é um cálculo estatístico). O tamanho é calculado com o número de contatos que os indivíduos têm. A posição no layout é definida pelo número de contatos. Quanto mais um indivíduo tiver contatos, mais ele/ela estará no centro. A rede mostra um núcleo muito ativo e algumas pessoas externas se envolvendo em tópicos específicos.