Ofício enviado à Presidência da República pede veto a dois dispositivos do PL 4.015/2023, que visa implementar medidas de proteção a autoridades do Poder Judiciário e do Ministério Público; leia na íntegra
Organizações da sociedade civil, entre elas a OKBR, enviaram ontem (dia 23/04) um ofício à Presidência da República pelo veto a dois dispositivos do PL 4.015/2023, que visa implementar medidas de proteção a autoridades do Poder Judiciário e do Ministério Público. No entanto, também inclui “jabuti” – ou brecha, no jargão jurídico – que altera a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei nº 13.709/2018) para restringir acesso a informações sobre membros do sistema de justiça.
O art. 9º inclui trechos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para determinar que o tratamento (incluindo a divulgação) de dados pessoais de juízes, procuradores e promotores “sempre” deverá levar em consideração “o risco inerente” ao trabalho desses agentes. Casos de “vazamento ou acesso não autorizado” deverão ser comunicados à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
A abordagem excessivamente genérica, sem definir o que seria o risco mencionado nem o que seria “vazamento ou acesso não autorizado”, abre uma enorme brecha para que tribunais e Ministérios Públicos passem a ocultar dados sobre remunerações ou ampliem a opacidade existente.
Já existe um mecanismo adequado para garantir o resguardo de informações que possam comprometer a segurança da sociedade ou do Estado, sem resultar na redução de transparência: a Lei de Acesso à Informação (LAI). De acordo com ela, a restrição do acesso aos dados deve se aplicar apenas a casos específicos, em que os riscos concretos estão minimamente definidos, e se limitar a um período de tempo estabelecido.
O PL também aumenta a multa para casos de irregularidades envolvendo dados pessoais de membros do Judiciário e do MP (art. 10). O agravamento da penalidade estipula uma diferenciação injustificada entre tais agentes públicos e outros indivíduos.
“É notório que a LGPD tem sido deturpada, por parte de algumas autoridades, para fundamentar negativa de transparência quanto a dados públicos, especialmente no que se refere à remuneração e a benefícios recebidos por agentes estatais. A sanção desses dispositivos agravará ainda mais esse cenário, comprometendo o controle social e a fiscalização cidadã dos gastos públicos”, afirma o ofício.
Para Katia Brembatti, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e coordenadora do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, os dispositivos foram aprovados justamente em um momento no qual a mobilização da sociedade contra o pagamento de supersalários, notadamente concentrado nas duas categorias às quais a proposta se refere, tem se intensificado.
“Causa indignação a imposição de obstáculos ao controle social sobre o gasto público, inclusive a título de pagamento de pessoal, pois contraria o direito de acesso a informações garantido pela Constituição Federal. É lamentável a aprovação de uma regra com esse condão”, afirma Brembatti.
Assinaram o ofício o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas e outras onze organizações: Associação Fiquem Sabendo, Open Knowledge Brasil, Transparência Brasil, Abraji, Plataforma Justa, República.org, Movimento Pessoas à Frente, Associação Livres, CLP (Centro de Liderança Pública), Instituto OPS e Transparência Internacional – Brasil.