O texto abaixo é uma adaptação de “Will Open Data Policies Contribute to Solving Development Challenges?”, de Fabrizio Scrollini, publicado no site da IV Conferência Internacional de Dados Abertos, que acontecerá em Madri, na Espanha, nos dias 6 e 7 de outubro de 2016.
Ao passo que a Carta Internacional de Dados Abertos ganha importância no contexto da agenda de desenvolvimento mais ampla, relacionada aos objetivos de desenvolvimento sustentável estabelecidas pela Organização das Nações Unidas, uma pergunta pertinente a se fazer é: as políticas de dados abertos vão contribuir para resolver desafios de desenvolvimento? Neste post, tento responder esta questão baseando-me em experiências recentes na América Latina a fim de contribuir para um debate global.
A América Latina vem explorando os dados abertos desde 2013, quando a primeira desconferência (Abrelatam) e a primeira conferência (ConDatos) aconteceram em Montevidéu. Em setembro de 2015, em Santiago, no Chile, uma comunidade vibrante de ativistas, servidores públicos e empreendedores se reuniram na terceira edição da Abrelatam e ConDatos. Esta é, agora, uma comunidade mais madura. Os dias nos quais era suficiente apenas abrir alguns conjuntos de dados e estabelecer um portal estão para trás. O foco desta reunião era na colaboração e uso de dados para abordar alguns desafios sociais.
Pegue, por exemplo, o setor da saúde. A transparência neste setor é a chave para uma entrega melhor das metas de desenvolvimento. Um dos painéis na ConDatos mostrou três formas diferentes de usar dados para promover transparência e empoderamento cidadão neste setor.
A tu servicio, um empreendimento conjunto da ONG uruguaia DATA e do Ministério Uruguaio da Saúde ajudaram a padronizar e abrir conjuntos de dados públicos que permitiram com que mais de 30.000 usuários melhorassem a forma pela qual escolhem planos de saúde. A colaboração entre governo e sociedade civil foi crucial neste processo em termos de partilha de recursos e competências. O primeiro protótipo só foi possível porque alguns dos dados já estavam abertos.
Este caso contrasta com Cuidados Intensivos, um esforço peruano com o objetivo de prover informações importantes sobre o setor de saúde. Ativistas peruanos tiveram que preencher pedidos de acesso à informação, transformar e padronizar dados para finalmente lançarem o projeto. Ambas as experiências demandaram uma grande capacidade técnica, política e de comunicação. E ambas mostram as posturas que o setor público pode adotar: se engajando ou ignorando o potencial dos dados abertos.
No mesmo setor, vemos um estudo recente lidando com a dengue e os dados abertos desenvolvido pela nossa iniciativa de pesquisa. Se organizações internacionais e países estivessem persuadidos a adotarem padrões comuns para casos de surtos de dengue, eles poderiam ser potencialmente previstos se os dados abertos certos estiverem disponíveis e padronizados. Dados abertos neste setor não apenas oferecem a prestação de contas mas também eficácia e prevenção para a alocação de recursos escassos.
Países da América Latina – reunidos no grupo de dados abertos da Rede Gealc – admitem o crescente valor público dos dados abertos. Este grupo se engajou construtivamente na ConDatos com os princípios consagrados na carta e vão alimentar a formalização de políticas de dados abertos na região. Uma revolução de dados não vai produzir resultados se os dados estiverem fechados. Quando você abre os dados, você permite que diversas iniciativas surjam e mostrem seu valor.
Uma vez que certo nível de maturidade é alcançado em algum setor em particular, mais dados são necessários. Padrões são cruciais para assegurar a comparação e facilitar a coleta, o processamento e o uso de dados abertos governamentais. Fomentar e interagir com usuários de dados abertos também é necessário, como várias estratégias implantadas por algumas cidades latino-americanas mostram.
Voltando a nossa questão: as políticas de dados abertos vão contribuir para resolver desafios de desenvolvimento? A experiência latino-americana mostra evidências de que vão. A estrada em direção à IODC 2016 em Madrid, na Espanha, vai precisar que nós discutamos mais sobre mostrar o valor e a colaboração para usar dados abertos governamentais a fim de resolver desafios de desenvolvimento. Dados e padrões são parte do núcleo. Mas as pessoas, o uso e as políticas são cruciais para transmitir a revolução de dados abertos através dos setores.
Fabrizio Scrollini é o Coordenador de Pesquisa da Iniciativa de Dados Abertos da América Latina. Ele é doutorando na London School of Economics and Political Science e Presidente da DATA, uma ONG uruguaia que trabalha com transparência, dados abertos, e desenvolvimento humano. Como acadêmico, Fabrizio está interessado em instituições de prestação de contas, acesso à informação, transparência e dados abertos.