Confira como foram os painéis do segundo dia do Coda Amazônia 2023
Compreender a demanda e a oferta informativa em comunidades locais e produzir narrativas desde a perspectiva do território deram o tom dos debates realizados nos dois painéis do Coda Amazônia 2023, nesta sexta-feira (1º), na Universidade Federal do Pará (UFPA), em Belém.
Transmitida no canal da Escola de Dados no YouTube, o primeiro painel contou com a presença de Jéssica Botelho, do Atlas da Notícia, e Bryan Araújo, Dora Marques e Nathaly Espitia, da Internews.
Jéssica destacou o trabalho do Atlas da Notícia para mapear os “desertos de notícias” na Região Norte. Esses “desertos”, de acordo com a definição do estudo, são os municípios que não possuem veículos jornalísticos sediados em seu território, e que, portanto, contam com pouca ou nenhuma cobertura das dinâmicas locais.
“Existe uma população desatendida de jornalismo em nível local. Temos que começar a pensar a partir do outro lado, a partir do território”, afirmou, pontuando, ainda, que o Norte tem, historicamente, mais desertos de notícias, mas também conta com veículos locais consolidados e de grande qualidade.
Dora apresentou os principais objetivos da Internews, uma organização internacional e sem fins lucrativos de suporte à imprensa. Ela ressaltou que entre os objetivos dos estudos realizados pela ONG no Brasil está encontrar as necessidades informativas das comunidades e entender se as informações chegam em quantidade e qualidade suficientes. “Uma vez que terminamos os estudos, podemos, em colaboração com os parceiros locais, desenhar projetos e iniciativas que mitiguem essas necessidades”, explicou.
Nathaly e Bryan falaram sobre pesquisas realizadas pela Internews em diferentes regiões brasileiras em que foram empregados recursos como a aplicação de questionários e entrevistas e a realização de grupos focais para mapear as necessidades informativas dos grupos analisados.
A pesquisa apresentada por Nathaly detalha a relação da população negra LGBTQIA+ do Rio de Janeiro com a mídia. Entre os resultados, destaca-se que 81% dos entrevistados relataram ter contato com discursos de ódio e 92% afirmaram ter sofrido violência (pela internet ou fora dela) durante períodos eleitorais. Além disso, 60% disseram não se sentir representados nos meios de comunicação. “Essas pessoas estão pedindo por representação para poder falar de coisas que são interessantes para elas, não somente sobre a violência que estão sofrendo”, avaliou Nathaly.
Já o estudo apresentado por Bryan, realizado no âmbito do projeto “Conservando Juntos” com integrantes das comunidades pesqueiras de Manaus e Manacapuru, no Amazonas, ainda está em desenvolvimento. A pesquisa tem como objetivo mapear o acesso a informações relevantes sobre o setor, como normas e recomendações para a atividade de pesca. De acordo com Bryan, há um grande interesse por esse tipo de conteúdo, mas os entrevistados relatam dificuldades para encontrar informações precisas. “O propósito da pesquisa é dar suporte para políticas públicas de comunicação. Como vamos chegar nas pessoas e dizer o que é proibido ou ilegal? O estudo vai nos ajudar a entender isso”, afirmou.
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Produção de dados para geo-histórias e redes
O segundo painel abordou a produção de dados para geo-histórias e redes. Sob mediação de Henrique Parra, da Lavits, a atividade contou com a presença de Edilma Prada, da Agenda Propia, Mariane Castro, do Observatório do Marajó, e Marlus Araujo, da Documental/Lavits.
“Geo-histórias são narrativas que documentam e tornam visíveis os conflitos, lutas e modos de vida desde a perspectiva do território onde se situam, ao mesmo tempo em que buscam tecer dados para construir conexões entre coletivos, experiências e lugares”, explicou Henrique.
A jornalista colombiana Edilma abriu a atividade propondo uma reflexão: contar histórias a partir de uma perspectiva de esperança. “Faz falta mais histórias de esperança conectadas com dados. Essa esperança que falta em nossos países e territórios. O jornalismo deve se apoiar em dados, mas também ser mais humano. A Amazônia está vivendo um cenário de violência, talvez o maior da história, mas também temos que contar essa realidade a partir da esperança dos povos de seus territórios”, defendeu.
Para a jornalista, outro ponto importante é reconhecer que há narrativas próprias nesses territórios e comunidades que precisam ser contadas pelo jornalismo de dados em conjunto com essas populações. “Para poder contar histórias sobre os povos indígenas, não podemos fazer somente nós que não somos indígenas. E se vamos contar essas histórias, devemos considerar também outros tipos de dados, como os sons, a cultura e a diversidade de línguas, por exemplo”, enfatizou.
Marlus apresentou a Documental, uma plataforma web de geo-histórias criada para a produção de narrativas investigativas baseadas em dados sobre direitos humanos, territoriais e ambientais que combina diversos tipos de mídias, como foto, vídeo e cartografia, para construir narrativas interativas. O projeto é uma iniciativa do MediaLab.UFRJ, laboratório experimental e transdisciplinar sediado na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A plataforma possui versões em inglês, espanhol e português.
“A Documental possibilita construir uma narrativa que consegue ir além do audiovisual e dos relatórios de um milhão de páginas, o que facilita que mais pessoas se apropriem dessas histórias e desses casos investigados. Então, o propósito da plataforma é promover esse debate público sobre justiça social e ambiental”, explicou.
Por fim, Mariane apresentou o projeto Filhas da Mãe do Fogo, iniciativa do Observatório do Marajó que parte da lenda de uma mulher que é narrada de diferentes formas nos territórios do Marajó, entre as comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas. O projeto tem como objetivo fortalecer os conhecimentos tradicionais e as boas práticas que essas mulheres já desenvolvem nas suas comunidades para prevenção, manejo e controle do fogo.
“A forma que encontramos para falar de dados oficiais com essas mulheres, que são o público-alvo do projeto, foi levar os dados oficiais sobre o panorama de queimadas no Marajó, conectando isso ao imaginário sobre o fogo, que é muito forte na região, por meio da lenda da Mãe do Fogo, que é essa mulher que defende a natureza a partir do enfrentamento pelo fogo. Muito diferente do que a gente vê hoje no Marajó: o uso do fogo para afastar as comunidades do seus territórios”, explicou.
Clique aqui para assistir o painel na íntegra.