Dez anos da OKBR | Primeira presidente do Conselho destaca a importância da organização para a provisão de dados no país

29 set de 2023, por OKBR

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Gisele Craveiro comenta sobre a contribuição da Escola de Dados para o aprimoramento das boas práticas de dados abertos; entrevista faz parte de série especial de aniversário

“A Open Knowledge não é apenas uma organização da sociedade civil. Ela é, também, uma rede de comunidades mundo afora. E eu atribuo essa construção de rede de conhecimento como um dos principais valores da organização.”

A citação é de Gisele da Silva Craveiro, mulher negra, mãe, pesquisadora e professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo (USP). Sua história se cruza com a OKBR em 2013, quando ajudou a fundar o capítulo brasileiro da Open Knowledge Foundation (OKF), tornando-se a primeira presidente do conselho deliberativo da Open Knowledge Brasil (OKBR). Sua relação com o tema permaneceu, desde então. Craveiro fundou a Red Internacional de Justicia Abierta e é membro do Conselho da Iniciativa Latinoamericana por los Datos Abiertos (ILDA).

Nesta entrevista, que faz parte de uma série especial para marcar o aniversário de dez anos da OKBR, ela destaca a contribuição da organização para o desenvolvimento da provisão de dados no Brasil na última década e seu papel frente ao capítulo mais trágico e recente da história: a pandemia de Covid-19. “A OKBR foi uma das organizações que se colocou na linha de frente pela defesa da informação pública no momento de emergência sanitária, em que o ecossistema de dados públicos epidemiológicos foi extremamente importante para a tomada de decisões.”

Para a próxima década, tendo em vista o contexto de polarização e desinformação atual, ela avalia que a OKBR deve seguir o bom caminho trilhado nestes últimos dez anos, trabalhando em prol do interesse público, de forma aberta e colaborativa.

Leia a entrevista na íntegra.

Open Knowledge Brasil: Como a história da OKBR se cruza com a sua?

Gisele Craveiro: Me descobri nesse universo quando desenvolvi minha pesquisa sobre Software Livre. Quando me tornei docente da Universidade de São Paulo (USP), em 2005, fui mergulhando cada vez mais nessa filosofia. Inicialmente, investigava Software Livre, mas depois passei a pesquisar outros movimentos abertos e a relação entre eles, o que me levou, por volta de 2010/2011, para um assunto bastante recente para a época, que era o movimento de dados governamentais abertos e a interface da abertura aplicada a dados e informações.

A partir daí, entrei em uma comunidade de dados abertos, onde conheci vários nomes brasileiros que se tornaram grandes amigos e amigas, colegas de pesquisa e de ativismo. Juntos, tivemos a oportunidade de nos unir a uma comunidade internacional que estava atuando para fundar o capítulo brasileiro da Open Knowledge Foundation. Meu primeiro encontro com essa comunidade foi no primeiro Open Knowledge Festival, em 2012, em Helsinque (Finlândia). Nesse primeiro evento, eu tive a oportunidade de conhecer várias pessoas da Open Knowledge Foundation que estavam promovendo esse ecossistema de novos capítulos da organização mundo afora. 

Tive a honra de ser a primeira presidente do conselho deliberativo da OKBR e de representar, por meio da organização, a sociedade civil brasileira em alguns fóruns de discussão e espaços de tomada de decisão. Nesse período, fui representante da sociedade civil no Comitê Gestor da Infraestrutura Nacional de Dados Abertos (INDA) e também atuei junto à comunidade internacional durante a implementação de alguns planos de ação do Brasil na Open Government Partnership (OGP).

OKBR: Na sua avaliação, quais são as principais contribuições da OKBR para a evolução do cenário relacionado a transparência e dados abertos no Brasil nos últimos dez anos? Quais ações ou projetos da OKBR você destacaria nessa trajetória e por quê?

GC: A Open Knowledge Brasil não é apenas uma organização da sociedade civil. Ela é, também, uma rede de comunidades mundo afora. E o valor da Open Knowledge começa nessa articulação, que proporciona que pessoas interessadas nos temas relacionados a transparência, dados abertos e governo aberto possam estar sempre aprendendo umas com as outras. E eu atribuo essa construção de rede de conhecimento como um dos principais valores da organização. Por meio dessa colaboração, tem-se desenvolvido um trabalho robusto para levar a pauta da transparência e de dados abertos e governo aberto junto a outras entidades, movimentos e organizações, contribuindo para a construção da massa crítica em universidades, órgãos públicos, espaços de tomada de decisões e implementação de políticas públicas.

Decorrente dessa articulação, observamos o desenvolvimento da provisão de dados no Brasil nos últimos dez anos, que podemos exemplificar com a criação do portal de dados abertos não só do governo federal, assim como de outras unidades da federação. A criação e manutenção de portais com essa finalidade foi um trabalho que teve apoio direto da Open Knowledge Brasil ou indiretamente de membros de sua comunidade. O trabalho desenvolvido pela Escola de Dados, com seus cursos para jornalistas e gestores públicos, também contribuiu para que essa abertura de dados ganhasse escala. É importante destacar também o papel da OKBR no cenário de metodologias de avaliação de abertura desses dados, contribuindo para o aprimoramento das boas práticas e o desenvolvimento de ferramentas e plataformas cívicas, que são alimentadas por dados públicos e mantidas pela OKBR. Muitos desses projetos ganharam, merecidamente, reconhecimento nacional e internacional, como o Gastos Abertos, ainda da minha época, e mais recentemente, o Querido Diário.

Não poderia deixar de mencionar, também, a grande contribuição da OKBR para um momento muito crítico da humanidade, que foi a pandemia da Covid-19. Ela foi uma das organizações que se colocou na linha de frente pela defesa da informação pública no momento de emergência sanitária em que o ecossistema de dados públicos epidemiológicos foi extremamente importante para a tomadas de decisões.

OKBR: Frente aos desafios e às oportunidades atuais, como você avalia que a OKBR deva direcionar seus esforços de atuação no próximo período?

GC: Nessa última década, tivemos alguns avanços sociais, apesar de alguns serem bem tímidos. Por outro lado, estamos lidando com o agravamento das mudanças climáticas e alguns problemas que se tornaram mais agudos com a desigualdade social e econômica dentro de um contexto de polarização e desinformação. Isso significa que necessitaremos, cada vez mais, de organizações como a OKBR e de outras que contribuam com esse trabalho em rede,  apoiando e fortalecendo uma comunidade que busca o acesso, a criação e o compartilhamento de conhecimento para o bem comum. Por isso, acredito que a OKBR deve seguir o bom caminho trilhado nestes últimos dez anos, trabalhando em prol do interesse público, de forma aberta e colaborativa.