Nem Lei de Acesso à Informação abre os dados da USP

26 set de 2014, por OKBR

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Dificilmente um órgão funciona bem sem que haja um eficiente controle externo. E para que o controle funcione, é fundamental que haja transparência.

Desde que a crise da USP se apontava no horizonte, fiz vários pedidos de informação com base nos direitos garantidos pela Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011). Os pedidos versavam sobre itens básicos para se poder conhecer a saúde financeira e possíveis desvios em uma instituição: patrimônio, orçamento e salários.

Cidade Universitária. Foto de Hamilton Furtado.  Licença CC 3.0 BY

Cidade Universitária. Foto de Hamilton Furtado. Licença CC 3.0 BY

O atual reitor afirma que tem tomado medidas para promover a transparência na instituição. Em recente entrevista, afirmou que “Nunca na história da USP houve tanta disponibilidade para abri-los [dados]. Nunca a vida financeira da universidade foi examinada com lupa de todos os lados.”

Mas será que isso está acontecendo na prática? Vamos aos fatos.

O primeiro pedido de informação foi iniciado em 14/12/2013, com o protocolo 520831314619. Seu objetivo era obter informações sobre o patrimônio mobiliário da USP oriundo das heranças vacantes. Foi feito no momento em que a USP Leste estava sob interdição e era necessário espaço para transferir as atividades:

Nos termos da Lei 12.527/2011 solicito a seguinte informação:

  1. Qual é a relação e localização dos imóveis localizados na zona urbana e rural provenientes de heranças vacantes incorporados, até junho de 1990, ao patrimônio da Universidade de São Paulo?
  2. Qual é o número de heranças jacentes que envolvem imóveis, joias, ações e outras aplicações no mercado financeiro incorporados ao patrimônio da Universidade de São Paulo?
  3. Qual é a relação e localização de imóveis que se encontram alugados provenientes de herança vacante e a sua respectiva receita mensal?
  4. Quem efetua a administração do patrimônio imobiliário da Universidade de São Paulo?
  5. Qual é o número de herança jacente que a Universidade de São Paulo espera ser transformada em herança vacante?
  6. Qual é a relação e localização dos imóveis vacantes transferidos ao patrimônio da USP que foram invadidos ou estão irregularmente ocupados?

O segundo, registrado em 06/06/2014 e com o número de protocolo 35485147606 era sobre remuneração de servidores:

Nos termos da Lei 12.527/2011 e do decreto federal que a regulamenta, venho por meio desta solicitar a planilha em formato aberto (conforme item III, do § 3 do Art. 8) com a remuneração bruta e líquida – portanto incluídas as gratificações e quaisquer vantagens – de todos servidores docentes e não-docentes da universidade (relação nominal) referentes aos meses de abril e maio de 2014.

Cabe dizer, que o Portal da Transparência disponibiliza a remuneração com a identificação nominal dos servidores de secretarias, fundações, empresas públicas e autarquias do Estado de São Paulo. No entanto, as universidades não têm seus dados em tal base.

O terceiro, protocolo 36200147609, tratava dos dados orçamentários detalhados da unidades:

Nos termos da Lei 12.527/2011, solicito o orçamento DETALHADO e COMPLETO da Universidade – isso inclui cada uma das Unidades, institutos e museus que a compõem a autarquia – os dados devem estar desagregados e em formato aberto (NÃO em PDF e conforme item III, do § 3 do Art. 8 da citada lei), referentes aos anos 2012, 2013 e 2014.

Os pedidos se referiam a informações públicas que estão em bases de dados da instituição. Dois deles poderiam ser mandados por e-mail. Já o orçamento detalhado caberia num CD ou pendrive.

Ao total arrepio da lei, as solicitações não foram respondidas pela USP. Foram feitos recursos para cada pedido após o esgotamento dos respectivos prazos de resposta que a universidade deveria cumprir. Havendo tramitado em todas as instâncias, os pedidos passaram também sem resposta pela Corregedoria-Geral da Administração (CGA), órgão que teoricamente deveria controlar a USP.

Com os números dos protocolos citados, o próprio leitor pode verificar o status dos pedidos neste link.

Tais informações constituem parte da caixa preta da USP, onde a suposta crise financeira convive com salários bem acima do teto legal – inclusive o do professor Zago – conforme atesta o relatório do TCE sobre a prestação de contas de 2011. A caixa preta da USP inclui ainda os repasses das fundações privadas que operam na instituição e outras verbas extraorçamentárias recebidas.

O princípio da publicidade é um princípio republicano elementar na gestão pública. Em se tratando de recursos públicos, não se pode ocultar tais informações. A Carta Magna deixa claro que todos os atos deverão ser públicos, restringindo ao mesmo tempo severamente quaisquer exceções.

A USP não pode ser uma ilha imune a leis e normas que regem a administração pública. Há de se lembrar sempre que a USP não pertence a seus gestores e que seus recursos provém, em sua imensa maioria, do trabalho dos milhões de contribuintes paulistas.

A falta de transparência cria terreno fértil para a surgimento da corrupção.

A insistência da USP em manter em sigilo tais informações públicas lança dúvidas sobre a reais intenções da gestão atual. Esperamos que a reitoria cumpra o que determina a lei e abra os dados da instituição.

Atualização do postagem. Com relação ao terceiro pedido, curiosamente obtive hoje resposta (29 de setembro) da CGA. Nela, anexam cópia de carta que enviaram ao reitor, cobrando resposta à solicitação de informação e comunicação da mesma à Corregedoria para acompanhamento. Para ver o documento na íntegra – que merece outra postagem com comentários – clique aqui.