Relatório da CPI de crimes cibernéticos propõe criação de 8 projetos de lei que ameaçam liberdade na internet

01 abr de 2016, por OKBR

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Em meio ao caos político do país, o Congresso Nacional apresentou ontem (31/04) o relatório final da CPI dos crimes cibernéticos, que deverá começar a ser discutido no próximo dia 7 e votado até 13 de abril.

A CPI, criada em agosto de 2015 para investigar quadrilhas suspeitas de desviar dinheiro de bancos e abordar crimes e violações dos direitos humanos na internet, foi presidida pela deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO).

O deputado Espiridião Amim (PP-SC) e os deputados Sandro Alex (PSD-PR), Rafael Motta (PSB-RN), Daniel Coelho (PSDB-PE) e Rodrigo Martins (PSB-PI) foram, respectivamente, relator e sub-relatores do texto que sugere a criação de oito projetos de lei de combate a crimes cibernéticos que também podem diminuir consideravelmente a liberdade dos brasileiros na internet.

O primeiro deles estabelece a perda dos instrumentos do crime doloso, em qualquer hipótese, como efeito da condenação. O segundo visa a alterar a redação do artigo 154-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para ampliar a abrangência do crime de invasão de dispositivo informático.

O terceiro PL recomendado pelo relatório tem como objetivo autorizar o uso dos recursos do Fistel (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações) por órgãos da polícia judiciária. A justificativa para que até 10% do fundo vá para a polícia judiciária seria de que os proponentes do projeto entendem “que a estruturação das polícias judiciárias para o combate aos crimes cibernéticos guarda total aderência com o principal objetivo do fundo, quer seja a fiscalização no uso dos sistemas de telecomunicações, aí inserida, logicamente, a rede mundial de computador (sic).”

O quarto projeto “inclui os crimes praticados contra ou mediante computador, conectado ou não a rede, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado ou de telecomunicação no rol das infrações de repercussão interestadual ou internacional que exigem repressão uniforme”, com investigação competindo à Polícia Federal sempre que o crime for notório.

Há também um pedido “determinando procedimento específico para a retirada de conteúdos que atentem contra a honra e outras providências”. Como parte da justificativa, figura o seguinte parágrafo:

Em primeiro lugar, foi levantada a questão dos crimes contra a honra. O procedimento previsto no MCI para a retirada de qualquer tipo de conteúdo, que não aqueles de conotação sexual, se dá via judicial. Entendemos que os crimes contra a honra – quando praticados pela internet, especificamente nas redes sociais -, são extremamente deletérios. A amplificação do dano advém da característica das redes sociais que permitem a replicação e a continuidade das postagens de forma impessoal e com pouco ou nenhum esforço. Some-se às facilidades digitais a possibilidade de viralização dos conteúdos, o que leva à possibilidade de a honra de uma pessoa ser destruída em poucos dias. Mais do que a honra, há vários casos de pessoas, adultos e crianças, que pereceram por causa desses ataques virtuais. Também, pleitos eleitorais podem ser extremamente influenciados por campanhas difamatórias praticadas pela internet, ainda mais em se considerando o curto tempo das campanhas eleitorais. Em suma, a demora no atendimento a remoções de conteúdos pode custar vidas e resultar em prejuízos, inclusive à democracia. (grifo nosso)

Os outros projetos de lei recomendados alteram o Marco Civil da Internet, estipulando que provedores e aplicações da internet devem incluir o IP como dado cadastral e liberá-lo para investigações sem a necessidade de ordem judicial, e também o bloqueio de aplicações da internet por meio de ordem judicial. O último dos projetos “estabelece a possibilidade de bloqueio de site voltado a disponibilizar conteúdo ilícito”.

Instituto Tecnologia e Sociedade do Rio foi a primeira instituição a se manifestar publicamente contra as medidas propostas no relatório:

O que mais pasma nesse relatório da CPI dos cibercrimes é como a internet é vista apenas como se fosse um “antro de perdição” e não como uma fonte de empregos, de inovação, de desenvolvimento, ou um instrumento essencial para o futuro do Brasil.

Em outras palavras, estão criminalizando a internet e colocando a rede sob o controle estrito do Estado. Esse é o mesmo caminho trilhado por países como a Arábia Saudita, Irã, Turquia, Coreia do Norte e Rússia.

É possível assinar a petição criada pelo ITSRio, a fim de pressionar o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional a barrar as propostas presentes no relatório final.

Recomendações do relatório foram previstas

Ainda em dezembro de 2015, uma matéria do Brasil de Fato alertava para a possibilidade de o relatório final da CPI recomendar a alteração do Marco Civil da Internet e estimular a aprovação em caráter de urgência de alguns PLs relacionados à rede. Sérgio Amadeu, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e membro da comunidade do software livre, em entrevista à matéria mencionada, alertou para a volta do PL Espião como pauta:

“Uma lei que pode ser votada com urgência é o PL 215, conhecido como ‘PL espião’. Um dos dispositivos da lei permite que as pessoas que criticarem deputados, autoridades, possam ter sua pena dobrada se a crítica for considerada injúria, calúnia ou difamação. O curioso é que ao mesmo tempo que a CPI quer tornar a vida do cidadão completamente transparente para o estado e corporações, o estado e as corporações são cada vez mais opacos na sociedade. É o contrário. Temos que ter privacidade para os fracos e transparência total para as ações dos poderosos.”