Advocacy e Pesquisa

Controlador de Manaus destaca estímulo de avaliações da sociedade civil para a transparência da cidade

03 set de 2020, por OKBR

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Na terceira entrevista da série sobre os processos de abertura de dados da Covid-19, foi a vez de conversar com Arnaldo Gomes Flores, Controlador Geral do Município de Manaus.

A capital amazonense é uma das mais bem avaliadas pelo Índice de Transparência da Covid-19, dividindo a primeira posição do ranking com Macapá (AP). Quando foi realizada a primeira avaliação pela Open Knowledge Brasil, em 16 de julho, o município ocupava a 6ª posição, com 70 pontos. Desde que se apropriou da metodologia do Índice, Manaus cresceu gradativamente até alcançar a pontuação máxima de 100 pontos na avaliação de 13/08. 

Para conhecer as estratégias e desafios para a ampliação da transparência do município no contexto da pandemia da Covid-19, a Open Knowledge Brasil e o Instituto de Governo Aberto se reuniram para entrevistar o Controlador Geral do Município de Manaus, Arnaldo Gomes Flores. Ele é bacharel em Ciências Contábeis e Econômicas pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e pós-graduado em Administração Financeira pelo Instituto Superior de Administração e Economia da Fundação Getúlio Vargas (ISAE/FGV). 

Arnaldo possui larga trajetória como servidor dos Correios e da Controladoria Geral da União (CGU), órgão pelo qual atuou com temas como controle social e transparência nos estados de Amazonas, Alagoas e Mato Grosso. Está na na Prefeitura de Manaus desde 2013, trabalhando com o controle interno e, posteriormente, na Controladoria Geral do Município. 

Arnaldo Gomes Flores, Controlador Geral do Município de Manaus

A conversa revela os pontos chaves que ajudaram Manaus a avançar em tão pouco tempo, ampliando o acesso a informações sobre a Covid-19, além de elencar desafios nessa trajetória, rotinas do cotidiano do acesso à informação, detalhes sobre a questão indígena e trazer perspectivas para o futuro da transparência da capital do Amazonas. 

OKBR/IGA: Qual o impacto da demanda por informações da pandemia na gestão de dados da prefeitura de Manaus? 

No início da pandemia, utilizávamos apenas o Portal da Transparência, mas, após reuniões técnicas, decidimos por contratar uma empresa para desenvolver o Portal Transparência Covid-19, que reúne informações específicas da Covid-19 e pode ser acessado por links nos demais portais.

A Prefeitura de Manaus passou a ser avaliada [no Ranking de Transparência no Combate à Covid-19] a partir de maio deste ano pela Transparência Internacional, quando o portal ainda estava em construção. No início, ficamos com apenas 35 pontos [de 100]. Para melhorar esse Índice, nós da Controladoria Geral do Município nos reunimos com gestores e técnicos da Secretaria de Finanças, de Comunicação e de Saúde em grupos informais de trabalho para somar conhecimentos e elaborarmos planos de ação, com prazos e responsáveis. Na avaliação de junho, o resultado do trabalho foi um grande avanço na avaliação da TI. 

No mês seguinte, já na primeira avaliação do Índice de Transparência da Covid-19, feita pela Open Knowledge Brasil, alcançamos 70 pontos. Ainda assim, por conta dos conhecimentos técnicos e do entrosamento da equipe, e do aval do prefeito, sabíamos que tínhamos condições de avançar mais. 

Na segunda avaliação do ITC-19, já subimos para 91 pontos e, na próxima, queremos gabaritar, chegando a 100*. Fizemos um trabalho para melhorar a compreensão da metodologia de avaliação, cruzamos dados e checamos nossos sistemas para confirmar se, de fato, todas as informações requisitadas estavam no portal.

* De fato, na avaliação seguinte à entrevista (13/04), Manaus foi a primeira capital a atender todos os requisitos do ITC-19 e atingir a pontuação máxima.

OKBR/IGA: Quais foram os desafios que vivenciaram com a publicação de dados durante a pandemia? 

No início da pandemia, não tínhamos a coleta de dados de bancos oficiais, ainda utilizávamos os formulários. Essa dificuldade foi superada na primeira quinzena de abril, quando abraçamos o e-SUS Notifica, disponibilizado pelo Ministério da Saúde, que é específico para informações sobre a Covid-19. Desde essa época, passamos a trabalhar também com os outros bancos de dados do ministério: SIVEP-Gripe para síndrome gripal, e GAL para ambientes laboratoriais). Não usamos sistemas próprios, mas as informações são todas revisadas pela Secretaria de Saúde para verificar se não há duplicidade. 

OKBR/IGA: Quais foram as mudanças provocadas pelo Índice de Transparência da Covid-19 no cotidiano da administração? 

A partir da primeira avaliação do Ranking da Transparência Internacional, as equipes começaram a se organizar para trabalhar em conjunto, e não mais isoladamente e criaram um grupo de WhatsApp. As ferramentas digitais ajudaram a aproximação inclusive com os outros setores, que passaram a se reunir virtualmente, já que estão em teletrabalho. Desde então, não paramos, pois as avaliações são constantes. Há o acréscimo de novos critérios e as exigências estão aumentando. 

Quando os servidores não conheciam as metodologias era mais difícil, mas conseguimos superar os obstáculos devido ao trabalho em equipe, com foco e o objetivo de fazer a transparência acontecer. Agora, as avaliações entraram na rotina e até gostam por se sentirem desafiados. 

Hoje, pesquisadores vão poder encontrar os dados que procuram diretamente no portal, de onde podem ser baixados, usados e trabalhados de diversas formas, sem precisar encaminhar pedidos de acesso à informação. A transparência de Manaus foi aprimorada a partir das metodologias que as organizações propuseram, foi um avanço com a colaboração de vocês. 

OKBR/IGA: Como a produção e publicação de informações diárias sobre a pandemia é organizada?

Na dinâmica do grupo de trabalho, a Controladoria Geral do Município é responsável por coordenar a implementação do Portal da Covid-19, assim como apontar desafios e pesquisar a legislação competente. Os técnicos da Secretaria Municipal de Saúde são encarregados de produzir, qualificar, atualizar e publicar as informações no portal. A Secretaria de Finanças, por sua vez, conta com uma área de Tecnologia da Informação e, por isso, oferece suporte para todas as Secretarias, inclusive para a de Saúde. Por fim, a Secretaria de Comunicação administra o contrato do Portal junto ao fornecedor que está construindo e evoluindo o portal. 

As informações que estão nos portais são todas baixadas do e-SUS Notifica, GAL ou SIVEP-Gripe. Elas alimentam também o serviço de teleatendimento da Saúde, que faz a triagem de pacientes e busca informações. Esse sistema é interligado com o prontuário eletrônico do cidadão – PEC que atende 68% da rede.  Além disso, apesar de nossa capacidade de testagem ser pequena, temos um sistema desenvolvido pela saúde para fazer o agendamento dos testes. 

OKBR/IGA: Como a Prefeitura de Manaus trabalha com as informações da pandemia relacionadas à população indígena?

Quem lidera esse trabalho é a Secretaria de Saúde, que tem um departamento voltado à questão entre os indígenas neste momento de pandemia. Construímos um hospital de campanha, que funcionou do início de abril até o final de junho. No início, não havia casos na população indígena, recebíamos principalmente idosos e pessoas com comorbidades. 

De repente, chegou. Foi criada uma ala para indígenas e a Secretaria de Saúde começou a mapear esses casos. Hoje, já se tem conhecimento sobre qual população indígena foi atingida e qual a forma de tratamento. 

O controle é feito através do e-Sus Notifica, que contém esse campo de informação. Como disse, não trabalhamos com sistema próprios, apenas com sistemas federais, por isso é imprescindível que esses dados tenham qualidade, pois são utilizados pelos 52 servidores, entre médicos, enfermeiros e demais especialistas do serviço de teleatendimento à saúde.

OKBR/IGA: Quais aprendizados a gestão da informação durante a pandemia pode gerar para que sejam aplicados nas outras áreas de atuação da prefeitura? 

Acredito que depois da pandemia o mundo não será mais o mesmo. Será preciso repensar a forma de gestão no serviço público. A experiência com o Portal da Transparência e da Covid-19 é um exemplo de que é preciso agir e rápido. A transformação tem que ser imediata, e essa forma de pensar precisa se expandir para outras áreas. Na pandemia, tivemos avanços em áreas como a educação. Os alunos ainda não voltaram para as escolas, mas estão fazendo a teleaula através de uma plataforma cedida pelo Estado e adaptada pelo município. 

Mesmo antes da pandemia, a Prefeitura já possuía um sistema que acompanha online as obras em execução na cidade. Isso mostra que as diferentes expertises precisam ser aproveitadas em todas as áreas, inclusive na Controladoria. 

Na pandemia, focamos no Portal da Covid-19. Apesar disso, estamos trabalhando para atualizar o Portal da Transparência, colocar mais informações de forma acessível, com dados que a população consiga baixar e trabalhar em formato aberto. Além disso, há alguns desafios que precisamos enfrentar como os dados abertos, o governo aberto, pois a transparência é apenas um item do governo aberto. Já avançamos bastante, mas sempre há algo a fazer. 

OKBR/IGA: Por fim, quanto os órgãos de controle e a pressão da sociedade civil contribuem para o processo de abertura? 

A transparência permite o acompanhamento da gestão e das ações dos gestores públicos. Como já estávamos trabalhando para melhorias no Portal da Transparência e no Portal da Covid-19, quando recebemos recomendações dos Ministérios Públicos Federal e Estadual e do Tribunal de Contas do Estado, foi tranquilo. Temos um sistema de gestão de documentos para que o auditor do Tribunal de Contas acesse os processos de contratação sem precisar ir até a Prefeitura.

Quando fomos mal avaliados, recebemos emails de pessoas cobrando que o município disponibilizasse as informações e melhorasse no ranking. A população acompanha essas questões e é consciente do seu direito de acesso à informação, por isso temos que trabalhar para atingir 100% de transparência ativa.